quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Offline


Saio no horário. 
Em um trabalho em que oito horas é apenas um símbolo, significa que tenho um dia ímpar em mãos.
Em um trabalho em que folga é usada para consumir o trabalho dos outros, significa que terei tempo para ficar em frente à TV assim que chegar em casa.

Pensamento positivo para que o ônibus não demore, que  o trem não demore, que o outro ônibus não demore.
Sincronismo perfeito. Tempo de sobra para ir ao mercado, aquele da esquina, sem filas.
Sem filas e sem luz. Em todo o bairro.
Sem luz, sem crédito? - Bendito gerador.

Em casa, sem gerador.

Tempo de sobra, tempo livre. Luz não falta, o  sol entra pela janela. 

Horário de verão. Cansaço de inverno.

Era tão divertido, mesmo nas baixas temperaturas de julho, mesmo morando em um balneário deserto. Afinal, ligávamos um lampião a gás e esperávamos o sono chegar entre risos, reclamações e um gibi do Chico Bento.

A tecnologia me deixou mimado. Afinal, nem me importei tanto com o banho gelado, mas ver o PS3, a TV e o modem sem energia me faz querer jogar o computador pela janela, só que ele ainda tem três horas de bateria.

Poderia estar correndo. Aproveitando os parcos raios de sol para ler. 

Mas quero reclamar. 

E reclamar sem poder acessar o Twitter me pareceu uma atividade tão exótica. 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Na Ponta dos Dedos

Minhas mãos queimam.

Nada mais fica na ponta da língua.

Depois que inventaram a internet é na ponta dos dedos que ficam os nossos desabafos e declarações.

Já faz um bom tempo que passei a sentir um calor intenso nas mãos. Não fui ao médico, é claro, porque um hipocôndriaco que se preze não vai ao médico.

Hipocôndriacos vivem da especulação, mas isso é outro assunto. O que eu quero falar aqui é que minhas mãos precisam ir ao psicólogo.

Esbravejar pelos teclados, digitar frustrações e atacar desafetos - impunemente - é uma delícia.
Raiva e desgosto debruçadas sobre caracteres.

Mas palavras na rede são um insulto ao ato nobre de insultar alguém olho no olho ou despachar desafetos com um pretenso sarcasmo.

Atividades que necessitam de muito mais coragem, causam muitos mais estragos e que, prudentemente, não colocamos em prática diariamente.

Só que, uma vez descoberta a válvula de escape digital, as palavras ficam na ponta dos meus dedos e no último instante eu as contenho, por uma contrariada obrigação moral.

Minhas mãos queimam.